quarta-feira, 13 de novembro de 2013

E cadê o respeito?

Olá, pessoal!

Pois é, há tempos que não escrevo, não?

Poderia desfilar para vocês um rosário de desculpas: as manifestações populares, a alta do dólar, a crise das empresas do Eike Batista, o aquecimento global e por aí vai. Mas a verdade nua e crua é a seguinte: faltou inspiração!

Mas hoje tive um momento “eureca”: baixou um causo! E tudo por causa de um cidadão chamado Justin Bieber.

Alto lá, não sou fã do cidadão! Como diria Marcelo Médici, “Cada um com seus ‘pobrema’”, certo? O tipo de música que ele faz não tem nada a ver com o meu gosto musical.

Acompanho, contudo, o noticiário. Vi que o cidadão acabou o show mais cedo em SP (apesar dos fãs terem ficado por semanas na fila, dormindo na rua), pichou muros no Rio e varreu o chão do palco com a bandeira da Argentina em Buenos Aires. Coisinhas mínimas, triviais mesmo, para o dia de hoje.

É claro que esse comportamento gerou críticas: menino mimado, birrento, problemático, sem profissionalismo e por aí vai. Isso não me causou qualquer espanto. O que me surpreendeu, e me deu a ideia para o causo, é que tem muito fã por aí que, apesar de ter sido desrespeitado pelo seu ídolo, ainda saiu em defesa do cidadão!

Véi, na boa: muita falta de amor próprio!

Mas pensando bem, quem sou eu para julgar o comportamento de pré-adolescentes sem o mínimo de “senso de noção”, que correm por aí atrás de um garoto-problema, são tratadas por ele como lixo e ainda se deliciam com isso?

Pois é. E sabem por que eu não julgo? Porque lá na longínqua década de 80, eu fazia parte desse bando de tapados!

Pela década, meus contemporâneos já deduziram a quem me refiro, certo?

A formação mais famosa, com figurinos dignos dos anos 80
Isso mesmo, ao grupo Menudo!

Quem era pré-adolescente no ano de 1985 sabe do que eu estou falando. A “menudomania” tomava conta dos lares das meninas daquela época. Eu, então, era fanática mesmo: discos de vinil, álbum de figurinha, cartazes espalhados pelo quarto, camisetas, revistas... tudo que falasse da banda, eu tinha.

O meu preferido era o Robi Rosa. Ah, eu adorava aquele cidadão, achava o garoto mais charmoso do planeta. Quando o sujeito cantava, eu babava, feito tonta, durante a música toda, tocada na minha vitrolinha Phillips vermelha, no melhor estilo Ultraje a Rigor.

E como toda fã que se preze, meu sonho era ir ao show da banda. Claro, era o meu sonho e o de todas as garotas brasileiras da época. Felizmente (ou não, aguardem), eu pude realizar esse sonho, em 1985!

Foi anunciado o famigerado show no Morumbi, e eu tinha que ir de qualquer jeito! Fizemos uma “caravana da coragem” aqui no bairro. Duas mães dotadas de uma paciência de Jó levaram três adolescentes tapadas ao Morumbi, para verem a banda de pertinho.

Bom, de pertinho era um eufemismo, né? Naquela época de vacas magras e inflação galopante, tudo o que o grupo conseguiu comprar foi um lugar na geral. Sabe o poleiro, lá em cima, lá longe, na linha do horizonte? Pois é, foi ali mesmo que nós ficamos.

No dia do show, lá fomos nós para o estádio do Morumbi. As mães carregavam lanches e água nas sacolas. Eu e minhas amigas, vestidas com camisetas do grupo, fizemos cartazes com fotos e declarações de amor eterno aos rapazes. Na nossa cabecinha oca, achávamos que nossos cartazes seriam vistos pela banda, do palco. E nós lá, na “geralzona”, vulgo “poleiro de pobre”.

Fala sério, criança é tão ingênua...

Lembro que os portões abriram à uma da tarde, e a nossa caravana já estava pronta para invadir o Morumbi. Foi a minha primeira vez em um estádio de futebol! Eu estava embasbacada com o estádio, com a euforia pré-show, uma alegria sem tamanho. Finalmente, veria os “menudos” ao vivo!

Veria, né? Vai lendo...

Munidas dos nossos ingressos da geral, fomos para os nossos lugares. Sinceramente, eu não tinha noção de que ficaríamos tão longe do palco. Íamos subindo as escadas, subindo, subindo... até que os degraus acabaram e aí sim, achamos nossos lugares. Literalmente, na “pqp”!

Eu e minhas amigas olhamos para o palco lá embaixo, lá longe, e pensamos: eba, vamos ver os menudos!

Adolescente sem noção é fogo...

O show estava marcado para começar às 8 da noite. Então ficamos sentadas na geral, desde a uma da tarde, esperando. E por muito pouco não ficamos esperando Godot!

Passamos o tempo da melhor forma possível. Conversando, cochilando sentadas, fazendo alguma brincadeira de criança. Não tínhamos celular, tablet, mp3. Aliás, nem fotos do evento nós temos, o rolo de filme era caro demais.

Pouco antes do show, começou a cair uma chuva torrencial em SP. Não era chuva, eram baldes d’água que caíam sobre nossas cabeças. A arquibancada da geral virou um complexo de cachoeiras e corredeiras. Se eu estivesse com a minha prancha de isopor, “pegaria” tranquilamente alguns “jacarés”. Estávamos com capas de chuva, mas de que adiantava? Ficamos completamente ensopadas. Nossos cartazes começaram a se desmanchar na água, e fazíamos de tudo para salvá-los. Afinal, os rapazes leriam a nossa arte elaborada com cola Tenaz e muito gliter, certo?

Acho que nem com binóculo!

A hora do show se aproximava, e já estávamos sem água e sem comida. Que estoque de alimentos dá conta de três adolescentes famintas? Mas na cabeça das mães, a fome duraria pouco. O show começaria no horário, iríamos para casa e beberíamos um gostoso copo de leite quente (vendido no saquinho) recém-fervido no fogão (naquela época não tinha micro-ondas).

Finalmente o relógio marcou 8 da noite. Nós, cartazes em punho e debaixo de chuva, estávamos prontas para berrar o repertório do Menudo, começando, de preferência, por “Não se reprima”.

Mas o show não começou. Então esperamos mais um pouco. Oito e meia, nove, nove e quinze, dez, dez e meia... e nada!

A movimentação no palco era intensa. No intuito de proteger os cantores da chuva, a equipe de apoio movia uma lona de plástico pra lá e pra cá. Dependendo de como era colocada, bloqueava a nossa visão do palco! Uma das mães que nos acompanhava não se aguentou e começou a berrar:

- Tira essa lona daí! “Tão” com medo de molhar a sapatilha, seus @$%&+!?!!

Eu, menina educada em colégio de freiras, olhava abismada para a tal mãe. Se alguém em casa, naquela época, falasse naquele tom e usando aquele palavreado, levaria um corretivo na hora!

Enquanto o pessoal da geral enfrentava as cachoeiras, o pessoal da pista começou a usar a lona que cobria o gramado do estádio para se proteger da chuva. E isso atrasou mais ainda o show, pelo crescente risco de choques elétricos. A fiação passava por baixo da tal lona, e os organizadores ficaram com medo de ligar os equipamentos de som e machucar alguém. Mas o que seria pior, algumas pessoas eletrocutadas ou uma multidão ensandecida por um show cancelado?

Situação difícil essa...

Por fim, decidiram começar o show com chuva e tudo, de qualquer jeito. Detalhe: passava das 11 da noite quando o quinteto pisou no palco, debaixo do maior toró. Eu e minhas amigas ficamos extasiadas pela visão dos nossos ídolos: todos eles poderiam ser cobertos por um simples dedo da mão, de tão pequenininhos que eram. Não tinha telão ou algo parecido, então só tínhamos a visão do grupo na versão “Playmobil” de formigueiro. O meu cartaz, a essa altura, já havia se jogado no seu próprio jacaré e descido arquibancada abaixo, na corredeira.

A água era tanta, mas tanta, que os menudos surfavam no palco. Um chegou a se espatifar gloriosamente no chão, acho que foi o Roy. A chuva não deu trégua em nenhum momento do show! E a certa altura, morrendo de vontade de fazer xixi, pedi para uma mãe me levar ao banheiro.

Pedido insano, claro. Como achar um banheiro no meio de um temporal, numa arquibancada cheia de gente, no escuro, em pleno estádio do Morumbi? Como acharíamos nosso lugar depois?

Foi aí que essa mãe, num momento de psicodélica lucidez, bradou pra mim:

- Tá louca, sair daqui agora? Faz nas calças mesmo, a chuva leva!

Heim?

Olhei pra ela, olhei para o palco e quase chorei! Como assim, fazer xixi nas calças? De propósito? Mamãe falou pra mim que isso era uma coisa muito feia de se fazer! Mas eu estava apertada, não tinha banheiro, tinha a autorização de um adulto... e me rendi. Molhei as calças, já ensopadas da chuva. Minha amiga, vendo a minha situação, comentou:

- Vou ter que fazer xixi também...

E foi no meu embalo!

Foi aí que um vislumbre de lucidez se abateu sobre a minha cabecinha de vento. Claro, não era apenas eu que estava naquela situação vexatória! Olhei para as cascatas de água que desciam arquibancada abaixo... e comecei a imaginar que estava submergindo numa correnteza de xixi! É claro que a molecada (e mães também) lá de cima também estava se aliviando. E se, num infortúnio, tivessem que fazer o número 2? E se o tal número viesse na minha direção?

Socorro!!

Senti um nojo absurdo. Naquela hora, o show acabou pra mim. Show que nem foi grande coisa, pra falar a verdade. Digo isso hoje, claro, mas na hora estava feliz da vida, até ocorrer o episódio do xixi.

Cerca de uma hora depois, acaba o espetáculo. Eu, minhas amigas e as mães fomos em direção ao nosso carro exaustas, cheirando a xixi e já dando sinais de resfriado. Quando voltamos para o nosso bairro, madrugada alta, meus pais já estavam na rua, preocupados com o atraso.

Entrei na casa feito um zumbi. Mal cumprimentei meus pais, não conseguia articular um discurso coerente, tamanho era o cansaço. Sem palavras, fui direto para o banheiro. Devo ter ficado uma meia hora no chuveiro, me aquecendo e tentando lavar aquela sensação de fedor de xixi que me acompanhava desde o estádio.

Depois do banho, um copo de leite quente e cama. Dormi profundamente, exausta, e só acordei para o almoço no dia seguinte.

Acordei bem. Bem “emputecida”, na verdade. Eu me sentia uma verdadeira trouxa. Fui atrás dos meus ídolos e acabei a noite ensopada e encharcada de xixi. Pra quê isso?

Narrei os acontecimentos para os meus pais que, claro, ficaram horrorizados. Eu estava, no mínimo, desapontada. Achava (e ainda acho) que não valeu a pena ter passado por todo aquele perrengue para ver o Menudo. Achava (e ainda acho) que os ídolos existem por causa dos fãs e, no melhor estilo “Tutubarão”, merecem respeito!

A consequência desse perrengue todo? Quebrou-se o encanto. Aos poucos, fui tirando os cartazes das paredes do quarto, jogando as revistas fora. Guardei os discos por algum tempo, pois eram artigos caros, não se jogava um vinil no lixo assim, do nada. Mas nem tinha mais vontade de escutar as músicas.

Para vocês terem uma ideia do quão traumatizante foi essa experiência, eu só fui novamente a um show, no mesmo Morumbi, em 2010. Fui porque era o Paul McCartney, artista de verdade que não toca com playback. E foi uma delícia, por sinal! Fiquei na pista (uma evolução, não?) e me diverti com os sucessos do Paul e dos Beatles. Ah, e o show do Paul atrasou um pouco: cinco minutos! Faz toda a diferença quando o artista respeita seu público, não?

Por isso que não entendo o fã que, mesmo destratado pelo seu ídolo, o defende. É coisa de gente masoquista, só pode ser! Mas como diz aquele velho ditado, “cada um, cada um”. Entendo a fascinação da relação ídolo/fã. Mas não admito, em hipótese alguma, ser destratada. Se por um temporal eu deixei de curtir um grupo musical, imagina se tivesse dormido por semanas na fila para ver um showzinho porcaria?

É, a molecada de hoje tem outra “cabeça”!


Boa noite, pessoal!

Um comentário:

  1. Show!! Adorei, estava com saudades dos seus perrengues. Meu primeiro show em estádio, foi também no Morumbi, fui ver o Queen, alguns anos antes.

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