Olá, pessoal!
Pois é, há tempos que não escrevo, não?
Poderia desfilar para vocês um rosário de desculpas: as
manifestações populares, a alta do dólar, a crise das empresas do Eike Batista,
o aquecimento global e por aí vai. Mas a verdade nua e crua é a seguinte:
faltou inspiração!
Mas hoje tive um momento “eureca”: baixou um causo! E tudo
por causa de um cidadão chamado Justin Bieber.
Alto lá, não sou fã do cidadão! Como diria Marcelo Médici, “Cada
um com seus ‘pobrema’”, certo? O tipo de música que ele faz não tem nada a ver
com o meu gosto musical.
Acompanho, contudo, o noticiário. Vi que o cidadão acabou o
show mais cedo em SP (apesar dos fãs terem ficado por semanas na fila, dormindo
na rua), pichou muros no Rio e varreu o chão do palco com a bandeira da
Argentina em Buenos Aires. Coisinhas mínimas, triviais mesmo, para o dia de
hoje.
É claro que esse comportamento gerou críticas: menino
mimado, birrento, problemático, sem profissionalismo e por aí vai. Isso não me
causou qualquer espanto. O que me surpreendeu, e me deu a ideia para o causo, é
que tem muito fã por aí que, apesar de ter sido desrespeitado pelo seu ídolo,
ainda saiu em defesa do cidadão!
Véi, na boa: muita falta de amor próprio!
Mas pensando bem, quem sou eu para julgar o comportamento de
pré-adolescentes sem o mínimo de “senso de noção”, que correm por aí atrás de
um garoto-problema, são tratadas por ele como lixo e ainda se deliciam com isso?
Pois é. E sabem por que eu não julgo? Porque lá na longínqua
década de 80, eu fazia parte desse bando de tapados!
Pela década, meus contemporâneos já deduziram a quem me
refiro, certo?
A formação mais famosa, com figurinos dignos dos anos 80 |
Isso mesmo, ao grupo Menudo!
Quem era pré-adolescente no ano de 1985 sabe do que eu estou
falando. A “menudomania” tomava conta dos lares das meninas daquela época. Eu,
então, era fanática mesmo: discos de vinil, álbum de figurinha, cartazes
espalhados pelo quarto, camisetas, revistas... tudo que falasse da banda, eu
tinha.
O meu preferido era o Robi Rosa. Ah, eu adorava aquele
cidadão, achava o garoto mais charmoso do planeta. Quando o sujeito cantava, eu
babava, feito tonta, durante a música toda, tocada na minha vitrolinha Phillips
vermelha, no melhor estilo Ultraje a Rigor.
E como toda fã que se preze, meu sonho era ir ao show da
banda. Claro, era o meu sonho e o de todas as garotas brasileiras da época. Felizmente
(ou não, aguardem), eu pude realizar esse sonho, em 1985!
Foi anunciado o famigerado show no Morumbi, e eu tinha que
ir de qualquer jeito! Fizemos uma “caravana da coragem” aqui no bairro. Duas mães
dotadas de uma paciência de Jó levaram três adolescentes tapadas ao Morumbi,
para verem a banda de pertinho.
Bom, de pertinho era um eufemismo, né? Naquela época de
vacas magras e inflação galopante, tudo o que o grupo conseguiu comprar foi um
lugar na geral. Sabe o poleiro, lá em cima, lá longe, na linha do horizonte? Pois
é, foi ali mesmo que nós ficamos.
No dia do show, lá fomos nós para o estádio do Morumbi. As mães
carregavam lanches e água nas sacolas. Eu e minhas amigas, vestidas com
camisetas do grupo, fizemos cartazes com fotos e declarações de amor eterno aos
rapazes. Na nossa cabecinha oca, achávamos que nossos cartazes seriam vistos
pela banda, do palco. E nós lá, na “geralzona”, vulgo “poleiro de pobre”.
Fala sério, criança é tão ingênua...
Lembro que os portões abriram à uma da tarde, e a nossa
caravana já estava pronta para invadir o Morumbi. Foi a minha primeira vez em
um estádio de futebol! Eu estava embasbacada com o estádio, com a euforia
pré-show, uma alegria sem tamanho. Finalmente, veria os “menudos” ao vivo!
Veria, né? Vai lendo...
Munidas dos nossos ingressos da geral, fomos para os nossos
lugares. Sinceramente, eu não tinha noção de que ficaríamos tão longe do palco.
Íamos subindo as escadas, subindo, subindo... até que os degraus acabaram e aí
sim, achamos nossos lugares. Literalmente, na “pqp”!
Eu e minhas amigas olhamos para o palco lá embaixo, lá
longe, e pensamos: eba, vamos ver os menudos!
Adolescente sem noção é fogo...
O show estava marcado para começar às 8 da noite. Então ficamos
sentadas na geral, desde a uma da tarde, esperando. E por muito pouco não
ficamos esperando Godot!
Passamos o tempo da melhor forma possível. Conversando,
cochilando sentadas, fazendo alguma brincadeira de criança. Não tínhamos
celular, tablet, mp3. Aliás, nem fotos do evento nós temos, o rolo de filme era
caro demais.
Pouco antes do show, começou a cair uma chuva torrencial em
SP. Não era chuva, eram baldes d’água que caíam sobre nossas cabeças. A arquibancada
da geral virou um complexo de cachoeiras e corredeiras. Se eu estivesse com a
minha prancha de isopor, “pegaria” tranquilamente alguns “jacarés”. Estávamos com
capas de chuva, mas de que adiantava? Ficamos completamente ensopadas. Nossos cartazes
começaram a se desmanchar na água, e fazíamos de tudo para salvá-los. Afinal,
os rapazes leriam a nossa arte elaborada com cola Tenaz e muito gliter, certo?
Acho que nem com binóculo!
A hora do show se aproximava, e já estávamos sem água e sem
comida. Que estoque de alimentos dá conta de três adolescentes famintas? Mas na
cabeça das mães, a fome duraria pouco. O show começaria no horário, iríamos
para casa e beberíamos um gostoso copo de leite quente (vendido no saquinho) recém-fervido
no fogão (naquela época não tinha micro-ondas).
Finalmente o relógio marcou 8 da noite. Nós, cartazes em
punho e debaixo de chuva, estávamos prontas para berrar o repertório do Menudo,
começando, de preferência, por “Não se reprima”.
Mas o show não começou. Então esperamos mais um pouco. Oito e
meia, nove, nove e quinze, dez, dez e meia... e nada!
A movimentação no palco era intensa. No intuito de proteger
os cantores da chuva, a equipe de apoio movia uma lona de plástico pra lá e pra
cá. Dependendo de como era colocada, bloqueava a nossa visão do palco! Uma das
mães que nos acompanhava não se aguentou e começou a berrar:
- Tira essa lona daí! “Tão” com medo de molhar a sapatilha,
seus @$%&+!?!!
Eu, menina educada em colégio de freiras, olhava abismada
para a tal mãe. Se alguém em casa, naquela época, falasse naquele tom e usando aquele
palavreado, levaria um corretivo na hora!
Enquanto o pessoal da geral enfrentava as cachoeiras, o
pessoal da pista começou a usar a lona que cobria o gramado do estádio para se
proteger da chuva. E isso atrasou mais ainda o show, pelo crescente risco de
choques elétricos. A fiação passava por baixo da tal lona, e os organizadores
ficaram com medo de ligar os equipamentos de som e machucar alguém. Mas o que
seria pior, algumas pessoas eletrocutadas ou uma multidão ensandecida por um
show cancelado?
Situação difícil essa...
Por fim, decidiram começar o show com chuva e tudo, de
qualquer jeito. Detalhe: passava das 11 da noite quando o quinteto pisou no
palco, debaixo do maior toró. Eu e minhas amigas ficamos extasiadas pela visão
dos nossos ídolos: todos eles poderiam ser cobertos por um simples dedo da mão,
de tão pequenininhos que eram. Não tinha telão ou algo parecido, então só
tínhamos a visão do grupo na versão “Playmobil” de formigueiro. O meu cartaz, a
essa altura, já havia se jogado no seu próprio jacaré e descido arquibancada
abaixo, na corredeira.
A água era tanta, mas tanta, que os menudos surfavam no
palco. Um chegou a se espatifar gloriosamente no chão, acho que foi o Roy. A chuva
não deu trégua em nenhum momento do show! E a certa altura, morrendo de vontade
de fazer xixi, pedi para uma mãe me levar ao banheiro.
Pedido insano, claro. Como achar um banheiro no meio de um
temporal, numa arquibancada cheia de gente, no escuro, em pleno estádio do
Morumbi? Como acharíamos nosso lugar depois?
Foi aí que essa mãe, num momento de psicodélica lucidez, bradou
pra mim:
- Tá louca, sair daqui agora? Faz nas calças mesmo, a chuva
leva!
Heim?
Olhei pra ela, olhei para o palco e quase chorei! Como assim,
fazer xixi nas calças? De propósito? Mamãe falou pra mim que isso era uma coisa
muito feia de se fazer! Mas eu estava apertada, não tinha banheiro, tinha a
autorização de um adulto... e me rendi. Molhei as calças, já ensopadas da
chuva. Minha amiga, vendo a minha situação, comentou:
- Vou ter que fazer xixi também...
E foi no meu embalo!
Foi aí que um vislumbre de lucidez se abateu sobre a minha
cabecinha de vento. Claro, não era apenas eu que estava naquela situação vexatória!
Olhei para as cascatas de água que desciam arquibancada abaixo... e comecei a imaginar
que estava submergindo numa correnteza de xixi! É claro que a molecada (e mães
também) lá de cima também estava se aliviando. E se, num infortúnio, tivessem
que fazer o número 2? E se o tal número viesse na minha direção?
Socorro!!
Senti um nojo absurdo. Naquela hora, o show acabou pra mim. Show
que nem foi grande coisa, pra falar a verdade. Digo isso hoje, claro, mas na
hora estava feliz da vida, até ocorrer o episódio do xixi.
Cerca de uma hora depois, acaba o espetáculo. Eu, minhas
amigas e as mães fomos em direção ao nosso carro exaustas, cheirando a xixi e
já dando sinais de resfriado. Quando voltamos para o nosso bairro, madrugada
alta, meus pais já estavam na rua, preocupados com o atraso.
Entrei na casa feito um zumbi. Mal cumprimentei meus pais,
não conseguia articular um discurso coerente, tamanho era o cansaço. Sem palavras,
fui direto para o banheiro. Devo ter ficado uma meia hora no chuveiro, me
aquecendo e tentando lavar aquela sensação de fedor de xixi que me acompanhava
desde o estádio.
Depois do banho, um copo de leite quente e cama. Dormi profundamente,
exausta, e só acordei para o almoço no dia seguinte.
Acordei bem. Bem “emputecida”, na verdade. Eu me sentia uma
verdadeira trouxa. Fui atrás dos meus ídolos e acabei a noite ensopada e
encharcada de xixi. Pra quê isso?
Narrei os acontecimentos para os meus pais que, claro,
ficaram horrorizados. Eu estava, no mínimo, desapontada. Achava (e ainda acho)
que não valeu a pena ter passado por todo aquele perrengue para ver o Menudo. Achava
(e ainda acho) que os ídolos existem por causa dos fãs e, no melhor estilo “Tutubarão”,
merecem respeito!
A consequência desse perrengue todo? Quebrou-se o encanto. Aos
poucos, fui tirando os cartazes das paredes do quarto, jogando as revistas
fora. Guardei os discos por algum tempo, pois eram artigos caros, não se jogava
um vinil no lixo assim, do nada. Mas nem tinha mais vontade de escutar as
músicas.
Para vocês terem uma ideia do quão traumatizante foi essa
experiência, eu só fui novamente a um show, no mesmo Morumbi, em 2010. Fui
porque era o Paul McCartney, artista de verdade que não toca com playback. E foi
uma delícia, por sinal! Fiquei na pista (uma evolução, não?) e me diverti com
os sucessos do Paul e dos Beatles. Ah, e o show do Paul atrasou um pouco: cinco
minutos! Faz toda a diferença quando o artista respeita seu público, não?
Por isso que não entendo o fã que, mesmo destratado pelo seu
ídolo, o defende. É coisa de gente masoquista, só pode ser! Mas como diz aquele
velho ditado, “cada um, cada um”. Entendo a fascinação da relação ídolo/fã. Mas
não admito, em hipótese alguma, ser destratada. Se por um temporal eu deixei de
curtir um grupo musical, imagina se tivesse dormido por semanas na fila para
ver um showzinho porcaria?
É, a molecada de hoje tem outra “cabeça”!
Boa noite, pessoal!
Show!! Adorei, estava com saudades dos seus perrengues. Meu primeiro show em estádio, foi também no Morumbi, fui ver o Queen, alguns anos antes.
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