quarta-feira, 10 de abril de 2013

Causos médicos

Caro leitor, não se assuste. Não lerá, neste post, nada de assustador, horripilante ou que inspire algum nojinho. Mas acreditem, até coisas que aconteceram em postos de vacinação, hospitais ou laboratórios podem virar um causo. E a proposta do blog é sempre te fazer rir, não esqueça!

A ideia para este causo surgiu ontem. Eu e mais três colegas de trabalho resolvemos criar vergonha na cara e reforçar a nossa dose da vacina antitetânica.

E por que fomos atrás da tal vacina?

Ah, porque no nosso trabalho estamos sempre nos cortando!

Explico. Aqui na Justiça Federal, temos que lidar com processos. Muitos deles, mais velhos do que nós mesmos. E as folhas são unidas por aquelas bailarinas de latão que, de graciosas, nada têm. Volta e meia, estamos nos cortando. Damos, literalmente, o sangue pela justiça!

Claro, não manuseamos apenas processos novos. Volta e meia chegam do arquivo aquelas velharias que, só de folhear, causam asfixia em uma pessoa mais alérgica. Isso sem falar que, de dentro do processo, podemos encontrar surpresas. Baratinhas, pêlos de rato, bolor insuportável... enfim, precisamos mesmo nos proteger, e nem sempre luvas e  máscara dão conta do recado.

A Adriana, colega fluminense nascida em Resende, foi quem levantou a bola. Afinal, ela está com as mãos tão retalhadas pelos cortes de bailarina que tenho a impressão de que o Edward Mãos de Tesoura é a sua manicure particular.

O primeiro a topar foi o Marcos (também conhecido pela alcunha de chefe). Ele deu uma pausa no seu bordão diário “Rapaz, cada coisa que eu vi...” ao ler os processos e decidiu a acompanhar a Adriana na empreitada. Eu, que já estava querendo reforçar a minha vacina há tempos, fui “no embalo”. E a Jane, a última integrante do quarteto fantástico, foi arrastada mesmo. A desculpa da Jane para não ir era a seguinte: estava de blusa com manga comprida, a injeção era no braço. Ah, vá!

Mostrei a ela uma manobra incrível para desnudar o braço: tirar a blusa! Uma ideia genial (tenho meus momentos), não? É só tirar uma das mangas e deixar o braço à mostra. Ou seja, nada de desculpas, vamos tomar a vacina.

Há semanas estávamos ensaiando a ida ao posto de saúde. Mas sempre acontecia algum imprevisto que nos impedia de ir. O mais notório foi o da gripe do chefe. Uma gripe “pero no mucho”, ou melhor, uma “gripe psicológica” (medo da injeção?), que adiava a nossa vacinação. Até que ontem a gripe deu uma trégua, e pudemos ir. Só tivemos que esperar a Adriana que, esbaforida, chegou atrasada, recuperando o fôlego. E lá fomos nós, de taxi, até o posto de saúde no Hospital Emílio Ribas.

Chegando ao posto de saúde, tiramos as nossas senhas, aguardando nossa vez. A atendente nos chamou e perguntou.

- Vão tomar vacina do quê?

Nós:

- Ah, tem vacina do quê pra gente tomar?

Só faltou pedirmos a “carta de vacinas”. Dissemos logo, queríamos a antitetânica.

Tenho que reconhecer, esse pessoal que aplica vacina em posto de saúde tem uma prática incrível. Acho que, pra eles, é como marcar a boiada a ferro e fogo. São tantos boizinhos tomando vacina todo dia que a injeção é dada como se fosse numa linha de montagem. Entra boi, aplica injeção, sai boi. E não dói!

Documentos em punho, quem vai primeiro? Essa história de “damas na frente” não vale mais. E o sufrágio universal, os direitos iguais? Então as meninas, sem mais delongas, deixaram o chefe ir na frente. E ele foi, batendo no peito no melhor estilo “macho man” e nos chamando de fracotes pra baixo. 

Em menos de 10 minutos, os boizinhos da Justiça Federal estavam imunizados, carteirinha de vacinação devidamente preenchida. Ainda tentamos dar um “xaveco” no pessoal para tomarmos a vacina contra a gripe, mas não funcionou. Não tínhamos grávidas ou idosos entre nós. Se bem que se fossem basear a nossa idade em termos de integridade física, todos nós seríamos vacinados. Tá todo mundo na idade do condor: com dor aqui, com dor ali...

Decidimos voltar a pé para o trabalho. Afinal, o fórum é na Paulista, pertinho do Emílio Ribas. Estávamos caminhando, contando piadas e rindo a valer, chamando a atenção dos transeuntes, quando a Adriana, sem mais nem menos, tem um ataque de riso! Todos pararam e olharam para ela que, depois de recuperar um fôlego, me disse:

- Fernanda, agora tenho um causo pra você!

Heim? Conta! E foi o que ela fez:

- Eu moro naquele prédio ali! E apontou para um prédio bege, do outro lado da rua.

Moral da história: ela foi correndo de casa para o trabalho, para nos encontrar quando, na verdade, ela mora a uma quadra e uma rua do posto de vacinação. Só que ela não havia se dado conta disso! Mas a gente releva, né? A mulher é fluminense, não se acha muito em SP e não tem muita noção espacial. Só vendo o prédio dela por outro ângulo é que se deu conta o quão ridiculamente perto do posto estava desde o início. Não resisti e comentei:

- Se alguém te perguntar a direção, é capaz de chegar a Resende, mas no bairro vizinho, nem pensar, né?

Voltamos para o trabalho e o dia transcorreu normalmente. A injeção começou a doer e, hoje de manhã, meu braço acordou em brasa e muito dolorido. Ou seja, nada de academia. Como cheguei mais cedo no trabalho, aproveitei para escrever este causo. Estava redigindo quando chegou o meu chefe, que também é madrugador aqui. Disse a ele:

- Cheguei cedo porque não deu para malhar, o braço dói e está em brasa...

Chefe:

- Ah, que frescura, heim? Eu não estou sentindo nada!

Minutos depois, chega a Jane:

- Meu braço também dói!

Opa, só o do chefe que não dói? Segundo ele, eis o provável motivo:

- Acho que não dói por causa dos tapas que a Jane me deu! Ela , achando que ia doer, ficava dizendo “E aí, tá doendo, chefe?” e me dando tapinhas no lugar da injeção. Acho que isso espalhou a vacina e não me deixou dolorido.

Nem vem, Jane, o momento das medidas paliativas foi ontem! Hoje estou realmente prejudicada.

Tomar vacina, na verdade, é fácil. O duro é quando preciso ir a um laboratório doar sangue, fazer exames ou tomar uma medicação.

Todos nós temos aquela veia “de jeito” para esse tipo de situação. Aquela que a enfermeira acerta de primeira e sem muito sofrimento. No meu caso, tenho uma única veia que se presta a isso. Uma só, filha única de mãe solteira. Quando a enfermeira se aproxima, eu já dou o braço esquerdo e falo:

- É essa aqui, ó. E só essa!

Algumas duvidam. Pensam que, por terem experiência, pegam veia de qualquer jeito, em qualquer lugar. Mas não no meu corpanzil, cara “colégua”. Aqui sou eu quem dá o texto!

Uma vez eu estava no pronto socorro, para tratar de uma das minhas inúmeras crises de coluna (idade do condor, lembram?). A atendente, contrariando minha orientação expressa, não quis pegar a minha veia jeitosinha no braço esquerdo. Quis ser diferente, a bruaca. E começou a garrotear e a estapear o braço direito. O motivo? Queria deixar a minha veia “reservada”. Como em receita de bolo, sabem? Então “deixe a única veia boa da paciente intacta e reserve”. E eu que me lascasse.

Furou uma, duas, três... SEIS vezes no braço direito e nada. A bruaca ainda tentou pegar a veia na minha mão, o que, pra mim, significa uma dor insuportável. Também nada. Até que eu perdi a paciência:

- Pelamordedeus, dá pra pegar a veia do braço esquerdo agora?

A mulher deu a mão à palmatória e preparou meu braço esquerdo. Só que aquele, definitivamente, não era o meu dia. A mulher foi com tanta sede ao pote que estourou a minha veia. A minha única veia decente. Socorro!!

Eu, que já estava no meu limite, explodi:

- CHEGA! Não vou tomar remédio p&¨%$ nenhuma, vou embora é agora!

Arranquei o garrote, levantei da cadeira com a graça e a leveza do Corcunda de Notre Dame e me arrastei para fora do pronto socorro. Arranquei também a pulseirinha de paciente e joguei longe. Que se danasse a dor da coluna, o tratamento já estava pior do que a doença!

Mas não foi só desta vez que a minha veia “véia de guerra” me deixou na mão. Recentemente, fiz uma cirurgia e, como sempre, avisei a equipe de enfermagem:

- Ó, só tenho essa veia aqui, ó!

A atendente não discutiu, já foi direto para o meu braço esquerdo puncionar a minha veia. Só que, infelizmente, a veia estourou na primeira picada.

Perdoem o desabafo, mas PQP!!!! E eu nem anestesiada estava...

Lá vai a mocinha procurar outra veia. Mas eu NÃO tenho outra veia dando sopa, tá tudo soterrado por uma bela camada de tecido adiposo. Como não tinha escolha, abri os dois braços nos respectivos suportes, como se estivesse sendo crucificada (melodrama é comigo mesmo), e fiquei à mercê de um bando de gente inexperiente.

Três atendentes, duas de um lado, uma de outro, me cutucavam simultaneamente atrás de uma veia. E nada. Eu, que já estava nervosa com a cirurgia, tinha vontade de sair correndo. Foram cerca de meia dúzia de tentativas em cada braço até eu falar, no melhor estilo FHC:

- Gente, assim não pode, assim não dá!

Foi só aí que chamaram uma enfermeira da UTI para lidar com o meu braço. A cidadã, de aspecto brucutu, me deu calafrios quando chegou. Pensei: agora eu definitivamente vou ter um treco. Só que não! Surpreendentemente, ela conseguiu um acesso na primeira tentativa, coisa de categoria mesmo. Respirei, aliviada, qualquer que fosse o gás que me deram para inalar e apaguei. Santa inconsciência!

Cirurgia feita, o médico me recomendou caminhar para acelerar a recuperação. Eu, na companhia da Fátima, andava pelos corredores, arrastando corrente (o soro) feito assombração. No mesmo andar, outros pacientes faziam o mesmo. E coincidia das minhas caminhadas serem feitas na mesma hora das de outra paciente.

Logo de cara eu detestei a tal mulher. Ela cruzava comigo no corredor e me olhava de cara feia, no melhor estilo “te pego na saída”. Afinal, o que eu havia feito pra ela? Não entendia! A mulher caminhava, a mãe dela empurrando o soro. E nada de olhar pra mim. E eu doida pra interagir... ansiava por aquele tricô de paciente, comparando cirurgia, tratamento e sofrimento, entendem? Poxa, é uma necessidade! A pessoa já está fragilizada e nem pode interagir com os colegas de andar? Muito injusto tudo aquilo.

O padrão da cara feia foi se repetindo. Três, quatro encontros. Até que no quinto, foi a mãe da jararaca que puxou assunto comigo:

- E aí, tá se recuperando bem?

Interação, finalmente! Respondi que sim, apesar da dor e blá blá blá... até que a mãe da paciente falou:

- Ah, para a minha filha está complicado, já que ela não enxerga de um olho, né?

Putz... Eu quase dando uma voadora na mulher que me olhava torto... porque não enxergava! Felizmente, tive alta no dia seguinte, pois não ia conseguir mais olhar na cara da mulher sem morrer de vergonha.

Agora, para encerrar o causo, vou contar de um perrengue que eu presenciei em um laboratório. Eu não sabia se ria ou se chorava, mas acabei rindo mesmo, fazer o quê...

Estava aguardando para fazer exames de sangue. Tudo na santa paz, até que ouço uma criança chorar copiosamente na sala de coleta. Era um menininho, deveria ter uns 3 ou 4 anos no máximo, e o coitadinho tinha que fazer exames de sangue. Claro, não sofria calado, certo? Mas o jeito que o menino expressava seu inconformismo era hilário, para dizer o mínimo.

Sabem aquele ditado “educação vem do berço”? Garanto para vocês, o menino nasceu em berço de ouro! Ele falava, soluçando e chorando copiosamente, para a enfermeira:

- Por favor... (snif...) não faz isso comigo!

Realiza a cena: a criança estava levando uma picada no braço e estava pedindo por favor! E mais:

- Por que a senhora (snif) tá fazendo (snif) isso comigo? Por favor, (snif, snif) não faz isso!

Ele chamava a enfermeira de senhora!

O laboratório parou para assistir. A enfermeira, de coração partido, não sabia mais o que fazer para continuar o exame. A mãe, resignada, só acalentava o filho, mantendo a calma e deixando a enfermeira fazer o que fosse preciso. Eu, morrendo de dó, quase saio da minha cadeira e grito: “vem aqui pro colo da titia, coisa fofa!”

Não teve jeito, a enfermeira teve que prosseguir e, finalmente, achou a veia do menino. Ele não sossegava:

- Aiiii!!! Tá (snif) doendo! Por (snif) favor (snif), senhora, para!! Buáaaa!!!

Exame feito, o menino vai para o colo da mãe. Já estava sem palavras. Só fazia snif, snif sem parar, tremendo a cada suspiro. Olhinhos azuis molhados de lágrimas, cabelinho loiro ensopado de suor. Um verdadeiro anjinho!

Agora, fala sério: mesmo em uma situação tensa dessas, não dá gosto de ver uma criança tão educada? Raridade nos dias de hoje!

Bom dia, pessoal!

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